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Especialistas debatem o mesotelioma, câncer causado pelo uso do amianto

24 abril 2014

Especialistas de diversas áreas do conhecimento estiveram reunidos nos dias 28 e 29 de março na sede da Fundacentro em SP para juntos apresentarem dados e as futuras linhas de trabalho sobre o tema mesotelioma.

Coordenado por Eduardo Algranti, médico pneumologista e pesquisador da instituição, o Seminário sobre Mesotelioma contou com a participação do médico italiano, Benedetto Terracini da Universidade de Turim, responsável por auxiliar a justiça italiana no julgamento dos processos que apresentavam mortes de trabalhadores causadas pelo uso do amianto, especialmente na região norte da Itália, em Casale Monferrato. O processo que teve fim em 2010 mostrou à justiça que além dos trabalhadores expostos ao asbesto, 21 mulheres também foram a óbito associados à contaminação ambiental pelo amianto.

Terracini observa que a realidade do Brasil não se distancia muito da italiana no que diz respeito ao uso do amianto. Seu inicio se deu na década de 70, alcançando o pico de uso do cancerígeno na década de 80. “A crisotila no Brasil é terrível e o maior problema quanto ao uso é o câncer de pulmão”, observa o médico.

O mesotelioma, de acordo com Algranti, é um tema emergente e considerado marcador da exposição ocupacional e ambiental do amianto. É um câncer raro, que afeta a pleura e/ou o peritônio e/ou o pericárdio, sendo mais raros nos dois últimos casos. “Considero a realização do Seminário, um referencial importante para que se definam diferentes frentes de trabalho com vistas à melhoria das informações epidemiológicas, pois o mesotelioma é um câncer de alta letalidade sendo a sobrevida de mais de 12 meses inferior a 10% dos casos, afirma o médico.

Considerado raro, o mesotelioma foi tema de tese de doutorado defendida por Francisco Pedra da Fiocruz. No trabalho acadêmico, o levantamento realizado de 1980 a 2010 mostra que além de sermos o terceiro maior produtor de amianto, os dados estatísticos ainda revelam números muito baixos de mortalidade. “Em um país onde se usa tanto amianto, não se pode compreender registros tão baixos de mortalidade”, observa o médico. Pedra ressalta que sua maior motivação para a pesquisa sobre o tema é de que outros possam “destrinchar” esses dados e melhorar ainda mais as informações.

Os dados apresentados pelo pneumologista e pesquisador, Eduardo Algranti da Fundacentro, revelam que em uma coorte (conjunto de pessoas que tem em comum um evento que se deu no mesmo período) de ex-trabalhadores de cimento amianto acompanhados até o final de 2010 houve 172 óbitos, dos quais, 160 com causas definidas, sendo 7 por asbestose, 7 por câncer de pulmão, 3 por câncer de laringe, 6 por mesotelioma, totalizando de 21 a 23 mortes diretamente relacionadas ao uso do amianto. Outro dado importante é que os três estados da região sudeste concentram a maioria dos casos de mesotelioma, SP, RJ e MG. Das 202 empresas que constam do cadastro do Ministério do Trabalho e Emprego, utilizadoras do amianto, 101 estão no estado de SP.

O amianto do ponto de vista jurídico

O grande problema enfrentado por parte dos magistrados ao elaborar a defesa está no desencontro de informações quanto aos números oficiais mostrando o número de casos relacionados ao amianto.

O procurador do trabalho, Luciano Leivas coloca que na maior parte dos processos, o argumento jurídico que vem sendo utilizado pelas industrias na elaboração da defesa é de que não há mais casos de trabalhadores adoecidos pelo amianto, em trabalhadores que ingressaram em empresas utilizadoras da fibra a partir de 1980, pois defendem a tese do trabalho seguro. Além disso, o procurador também observa que a ocorrência do dano só pode ser provada pelo sistema jurídico mediante o estabelecimento da responsabilidade. “Essa é nossa grande preocupação e nossa participação neste Seminário é extremamente importante para compreendermos toda a parte cientifica aqui apresentada”, diz Leivas.

Não é só a magistratura que enfrenta o desencontro de informações. A falta de dados que aponte os reais casos de trabalhadores adoecidos pelo uso do amianto foi outro ponto de discussão durante o Seminário. Fernanda Giannasi, assessora da ABREA (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto), pontuou sobre a questão do transporte e do armazenamento da fibra e enfatizou a necessidade de vigilância para trabalhadores que transportam e armazenam amianto para entregas, importação e exportação. Para ela, a subnotificação e a ausência de dados estatísticos é lamentável, pois até 1991 as empresas não eram culpabilizadas. “É necessário que tenhamos uma base de dados confiável para que nos auxilie e ajude o sistema judiciário também”, observa a engenheira.

O Ministério Público do Trabalho da região de Campinas vem, há mais de 3 anos buscando subsídios para o embasamento de suas ações judiciais, bem como a verificação do ambiente laboral. Por meio do Projeto Nacional de Banimento do Amianto, a vice-coordenadora, doutora Marcia Kamei Lopez Aliaga ressalta que todo o trabalho que vem sendo feito é no sentido de banir o amianto crisotila. “Temos a ótica do judiciário, mas necessitamos do conhecimento científico da Fundacentro”, reforça a procuradora.

 

Estudos futuros

Após dois dias de intensa discussão, os especialistas definiram as futuras linhas de trabalho para que haja informações de qualidade disponíveis no que se refere aos registros dos casos de mesotelioma.

A primeira delas será a constituição de um grupo que estude os subregistros divividos em duas bases: a populacional e a base hospitalar. A segunda será mapear os casos de mesotelioma para que possa auxiliar os pesquisadores e profissionais quanto à ocorrência e concentração de casos em determinadas regiões/municípios para auxiliar o Sistema Único de Saúde a planejar ações de vigilância. A terceira refere-se a um estudo ampliado de morbi-mortalidade em trabalhadores ocupacionalmente expostos.

Fonte: Especialistas debatem o mesotelioma, câncer causado pelo uso do amianto